8 de agosto de 2025

Aline Bei: ‘o que me tornou leitora não foi um livro, mas a percepção, já na infância, da minha solidão particular’

Aline Bei Crédito: Isadora Arruda
Compartilhe

Autora de O peso do pássaro morto, Pequena coreografia do adeus e Uma delicada coleção de ausências é a última entrevistada do especial do Le Monde Diplomatique Brasil

Le Monde Diplomatique Brasil 

Após um mês repleto de entrevistas com grandes nomes da literatura brasileira contemporânea, o especial do Le Monde Diplomatique Brasil em comemoração ao Dia Nacional do Escritor (25 de julho) chega ao fim. 

A última entrevistada é Aline Bei, autora de O peso do pássaro mortoPequena coreografia do adeus e Uma delicada coleção de ausências. 

Com uma linguagem bastante poética, a escritora se tornou um dos grandes acontecimentos recentes da literatura brasileira e uma das vozes mais originais da arte contemporânea no país. “Na literatura, como no corpo, as coisas não são facilmente separáveis. Enredo e linguagem são órgãos vitais. Para que um texto exista, é preciso que suas partes coexistam, formando uma espécie de unidade singular”, disse.  

Confira a entrevista na íntegra: 

Qual tema é a sua grande obsessão como ficcionista? De que forma esse tema se relaciona com a sua vida fora da literatura? 

Obsessão é anterior ao tema, não tem nome, existe num lugar que chamo de porão. Se mantém na penumbra, entre o consciente e o inconsciente, naquele estado de vigília típico dos pressentimentos. Sua presença tem um quê animal, no meu caso pequeno, que respira de modo perturbador. Quando escrevo, desço ao porão, correndo o risco de matar o animal ou ser morta por ele. 

Para escrever um bom livro, o enredo e a linguagem têm a mesma importância? 

Na literatura, como no corpo, as coisas não são facilmente separáveis. Enredo e linguagem são órgãos vitais. Para que um texto exista, é preciso que suas partes coexistam, formando uma espécie de unidade singular.   

Qual livro você mais gosta de reler? Por quê? 

Os de poesia, por serem um enigma sem cansaço. 

Qual obra literária foi essencial para que você se tornasse uma leitora? E uma escritora? 

O que me tornou leitora não foi um livro, mas a percepção, já na infância, da minha solidão particular. Iminente e intransponível, a mesma que me tornou escritora também.  

Em 25 de julho foi comemorado o Dia Nacional do Escritor. Na atualidade, o que os autores e as autoras mais têm a celebrar no país? E com o que eles e elas devem se preocupar? 

Para celebrar: a crescente diversidade da literatura contemporânea brasileira, os clubes de leitura, as feiras literárias. 

Para se preocupar: acesso à leitura e a manutenção afetiva de leitores pelo país.  

Em sua opinião, qual escritor ou escritora merece maior atenção de leitores, leitoras, editoras e da crítica especializada no Brasil? 

Grace Passô. Ela é uma autora de prestígio, mas sinto que a dramaturgia ainda é pouco debatida no Brasil, mesmo entre grupos que lê.   

Qual foi o melhor conselho que você já recebeu no meio literário? E o pior? 

Não gosto muito de conselhos, me incomodo especialmente com o tom. Acredito no poder das trocas mais horizontais, nas boas conversas e leituras. Ou então no espanto que certos textos nos causam por resgatar o inominável em nós. 

O que move sua escrita? 

Minhas obsessões. 

 

Sobre a autora 

Aline Bei nasceu em São Paulo, em 1987. É formada em letras pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e em artes cênicas pelo Célia Helena Centro de Artes e Educação e pós-graduada em escritas performáticas pela PUC-Rio. É autora dos romances O peso do pássaro morto, vencedor do prêmio São Paulo de Literatura (2017) e do prêmio Toca; Pequena coreografia do adeus, finalista do prêmio Jabuti (2022); e Uma delicada coleção de ausências (2025). 

 

Bruno Inácio é jornalista, mestre em comunicação e autor de Desprazeres existenciais em colapso (Patuá), Desemprego e outras heresias (Sabiá Livros) e De repente nenhum som (Sabiá Livros). É colaborador do Le Monde Diplomatique, Jornal Rascunho e São Paulo Review e tem textos publicados em veículos como Rolling Stone Brasil e Estado de Minas.